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Intervenções Assistidas por Equinos e a Autorregulação Emocional: Um Caminho Neurobiológico e Experiencial para o Equilíbrio Psicológico



A autorregulação emocional é um dos pilares fundamentais da saúde mental e do bem-estar psicológico. Consiste na capacidade de gerir e modular emoções de forma adaptativa, permitindo responder aos desafios do quotidiano sem ser dominado pelo stress, pela ansiedade ou por reações impulsivas. No entanto, esta competência nem sempre se desenvolve de forma espontânea e pode ser especialmente desafiante para pessoas que enfrentam níveis elevados de stress ou dificuldades emocionais.

 

Nos últimos anos, as intervenções assistidas por equinos (IAE) têm vindo a destacar-se como uma abordagem inovadora e eficaz para o desenvolvimento da autorregulação emocional. 

 

Mas o que torna estas intervenções tão impactantes? 

A resposta reside na interação entre neurobiologia, experiência emocional e aprendizagem experiêncial.

 

Os Cavalos como Facilitadores da Regulação Emocional

 

Os cavalos são animais sociais, extremamente sensíveis à comunicação não verbal e ao estado emocional dos humanos. Esta sensibilidade permite-lhes agir como um biofeedback natural, refletindo, de forma imediata, a energia, a coerência emocional e a intenção dos indivíduos que interagem com eles.

 

Deste modo, para obter uma resposta calma e colaborativa de um cavalo, o participante tem de regular o seu próprio estado interno. Este processo é fundamental porque permite que a regulação emocional aconteça de forma vivencial e experiencial, ao invés de apenas ser abordada teoricamente, como acontece em muitas intervenções psicoterapêuticas tradicionais.

 

O Impacto Neurofisiológico das Intervenções Assistidas por Equinos

 

A interação com cavalos promove alterações neurobiológicas que favorecem a autorregulação emocional. Estudos indicam que o contacto com equinos pode:

Reduzir os níveis de cortisol, a hormona associada ao stress e à resposta de luta ou fuga.

Estimular a libertação de ocitocina, a hormona do vínculo e do relaxamento, promovendo segurança emocional.

Ativar o sistema nervoso parassimpático, responsável pela resposta de descanso e recuperação, essencial para equilibrar estados emocionais elevados.

Diminuir a atividade da amígdala, a estrutura cerebral associada ao medo e à reatividade emocional intensa.

 

Estes efeitos traduzem-se numa maior capacidade de gerir impulsos emocionais e reações ao stress, tornando a pessoa mais resiliente perante desafios emocionais e melhorando a sua capacidade de adaptação.

 

Aprendizagem experiêncial e Autorregulação Emocional

 

Um dos aspetos mais transformadores das IAE é que a aprendizagem ocorre através da experiência direta com os cavalos. Diferente das abordagens puramente verbais, neste contexto, o corpo e as emoções são envolvidos ativamente no processo.

 

A experiencialidade facilita a internalização de estratégias de autorregulação emocional, pois cria memórias emocionais profundas, que podem ser mais facilmente acedidas em momentos de stress. Por exemplo:

Se um participante aprende a regular a sua respiração para acalmar um cavalo, esse mesmo mecanismo poderá ser automaticamente ativado em situações futuras de ansiedade.

Se aprende a modular a sua energia para comunicar de forma mais eficaz com o cavalo, essa competência poderá ser aplicada em interações interpessoais desafiantes.

 

Além disso, a regulação emocional através do corpo torna-se mais intuitiva, o que é especialmente relevante para pessoas que têm dificuldade em identificar e expressar emoções verbalmente.

 

A Co-Regulação e o Papel dos Cavalos na Gestão Emocional

 

A co-regulação é um processo essencial no desenvolvimento da autorregulação emocional. Envolve a capacidade de modular os estados internos através da interação com outro ser vivo que oferece segurança e estabilidade emocional.

 

Os cavalos, ao serem altamente sensíveis ao estado emocional humano, podem ajudar as pessoas a desenvolver esta competência. Durante as intervenções assistidas por equinos, os participantes aprendem que a forma como regulam a sua energia, a sua respiração e a sua intencionalidade afeta diretamente a resposta do cavalo.

 

Isto permite:

Desenvolver maior consciência emocional e corporal.

Aprender a regular emoções em tempo real, através do feedback do cavalo.

Criar um espaço seguro onde a pessoa pode experienciar diferentes estados emocionais e encontrar estratégias para os gerir de forma eficaz.

 

Integração das IAE com Abordagens Psicoterapêuticas

 

As IAE não funcionam isoladamente, mas podem ser complementares a diversas abordagens psicoterapêuticas, potenciando os seus efeitos. Entre as terapias mais compatíveis com as IAE, destacam-se:

 

1.Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC)

Trabalha a identificação e reestruturação de padrões de pensamento desadaptativos.

O feedback imediato do cavalo permite ao participante perceber como as suas crenças e emoções influenciam o seu comportamento.

Técnicas de exposição gradual podem ser aplicadas para tratar fobias ou ansiedade social, com o cavalo a servir como mediador do processo.

 

2.Terapias de Terceira Geração (Mindfulness, Terapia de Aceitação e Compromisso, Psicoterapia Somática)

A presença dos cavalos favorece a prática de mindfulness, promovendo o foco no momento presente e a aceitação da experiência interna.

A Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) beneficia da interação com cavalos para trabalhar a flexibilidade psicológica, ajudando os participantes a lidar com emoções difíceis sem evitá-las.

A psicoterapia Somática encontra nos cavalos um meio ideal para explorar a expressão somática das emoções, permitindo desbloquear tensões emocionais.

 

3.Intervenção em Trauma e Stress Pós-Traumático (TEPT)

A relação com o cavalo pode ajudar a restaurar um sentido de segurança em pessoas com histórico de trauma.

A experiência de contacto físico e interação não verbal facilita o processamento de emoções sem necessidade de exposição verbal imediata.

O envolvimento em atividades estruturadas com o cavalo permite reconstruir a confiança e a capacidade de regulação emocional.

 

O Impacto das Intervenções Assistidas por Equinos na Saúde Mental

 

As IAE são cada vez mais reconhecidas como uma abordagem eficaz para pessoas que lidam com dificuldades emocionais, incluindo ansiedade, stress pós-traumático, perturbações emocionais e dificuldades na gestão da impulsividade. A investigação demonstra que estas intervenções podem:

Melhorar a resiliência emocional, promovendo a capacidade de lidar com adversidades.

Aumentar a tolerância à frustração e a capacidade de gerir emoções intensas.

Melhorar a autoeficácia, promovendo um maior sentido de controlo sobre as emoções e comportamentos.

Reforçar a consciência emocional e a capacidade de introspeção, essenciais para o desenvolvimento pessoal e profissional.

 

Conclusão

 

As intervenções assistidas por equinos oferecem um caminho inovador e eficaz para o desenvolvimento da autorregulação emocional. A combinação de neurobiologia, aprendizagem experiencial e co-regulação com o cavalo cria um ambiente único para a prática de estratégias de gestão emocional, proporcionando mudanças significativas e duradouras.

 

Numa sociedade onde o stress e a ansiedade são desafios constantes, esta abordagem revela-se um instrumento útil e eficaz para a promoção do equilíbrio emocional, da resiliência e do bem-estar psicológico.


Chantal Feron

Psicóloga Clínica

 
 
 

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